Ateliê Literário | Edição 38 - Novembro/2023

Construindo o “Ser”

Ilustração: Fernando Siniscalchi

Deborah Sandes

Os dois registros de Deborah Sandes, participante da oficina “Narrativas de mulheres negras à margem da democracia brasileira”, proposta pela professora e pesquisadora Elaine Correia de Oliveira, ministrada em setembro na Biblioteca de São Paulo, no âmbito do projeto Literatura Brasileira no XX, trazem reflexões e referências sobre o conteúdo apresentado durante os encontros, que abordaram as perspectivas de escritoras que marcam a literatura contemporânea do século XXI, entre elas, Conceição Evaristo.

Confira!


Foi um processo desafiador escrever o poema. Tentei por algumas vezes começar, mas não conseguia, estava muito “formatada” para a escrita de textos mais rígidos. Aqueles com certo rigor acadêmico, por conta da pesquisa de doutorado que venho desenvolvendo.

Os dois vídeos[1] de inspiração foram muito importantes para o desenvolvimento do texto. Mostraram duas perspectivas distintas e impactantes sobre a relação da mulher com suas famílias. Ter esta consciência de que somos um acúmulo de experiências ancestrais, independente de como encaramos a nossa realidade, foi o que me motivou a escrever algumas linhas...

Assisti algumas vezes os dois vídeos. Na última vez me permiti apenas escrever o que viesse à cabeça, sem muito raciocínio, deixando as palavras fluírem e expressarem o que eu acabara de presenciar nos vídeos.

Confesso que deixar fluir, sem muito controle e sem muito juízo de valor ou rigor acadêmico, foi bem interessante... Simplesmente escrever o que surgia na mente, encadeando as frases com muita liberdade.

Por fim, parei de escrever e retomei a leitura do que havia escrito para ajustar algumas frases, dar ênfase em alguma ideia e conectar melhor a junção entre elas.

Quando me permiti deixar a criatividade aflorar mais livremente, a escrita foi relativamente rápida e eu gostei do resultado deste pequeno poema, chamado “Ser” (ver abaixo).



[1] Vida Maria (2006), de Márcio Ramos. Online: https://www.youtube.com/watch?v=yFpoG_htum4  

  Ocupação Conceição Evaristo (2017), Itaú Cultural. Online:  https://www.youtube.com/watch?v=5QBXp-MqF18


Ser

Deborah Sandes

Somos únicas e ao mesmo tempo tantas,

Somos o acúmulo do tempo e da sabedoria...

Sabedoria daquelas que vieram antes de nós,

Sabedoria ancestral,

Sabedoria intrínseca ao ser mulher!

Sabedoria de vida!

Ah, e que vida?

Vida sofrida, vida feliz, vida imposta, vida sonhada, vida roubada, vida almejada, vida vivida...

Vida da rotina, do dia a dia, do constante fazer e refazer-se...

Vida de criar e recriar ou apenas copiar e rememorar?

Será que algo, hoje, eu posso mudar?

Se tudo sempre foi assim, será que eu também tenho que ser assim?

Como faço para mudar?

Não posso abandonar minha raiz,

Mas também não posso viver assim...

Não consigo ser outra, além de mim!

Tenho minhas vontades, meus anseios, meus sonhos...

Deste lugar, eu sei que eu posso melhorar!

O mundo eu posso conquistar!

A minha realidade eu posso transformar!

Sei que as que vieram antes de mim, comigo hão de estar,

Afinal, uma aventura, quem não gosta de encarar?

E juntas, vamos todas celebrar!